domingo, 26 de outubro de 2008

Citação da semana

“Os fariseus, ouvindo que ele fechara a boca dos saduceus, reuniram-se em grupo e um deles – a fim de o por à prova – perguntou-lhe: ‘Mestre, qual é o maior mandamento de lei?’ Ele respondeu: ‘Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento. Esse é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a esse: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Desses dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas”. (Mt 22, 34-40)

Uma vez mais, como na passada semana, mais um teste por parte dos fariseus, na expectativa de apanhar Jesus em falso. Mais um episódio daquele jogo dialéctico que frisei na passada semana. Jesus resume a Lei e os profetas em dois mandamentos chave: amar a Deus e ao próximo.
Esta é uma passagem com muitos paralelos, não só nos outros Evangelhos, como também por toda a Bíblia. O mandamento do amor a Deus é o cerne da lei judaica propriamente dita. Aqui é recapitulada e actualizada por Cristo, juntando-lhe o amor ao próximo em pé de igualdade. Há muitos aspectos a explorar nesta passagem… Fica a sugestão de uma leitura atenta. Dúvidas, para o mail.

domingo, 19 de outubro de 2008

Citação da semana

(…) “Os fariseus fizeram um conselho para tramar como apanhá-lo por alguma palavra. E enviaram-lhe os seus seguidores, juntamente com os herodianos, para lhe dizerem: ‘Mestre, sabemos que és verdadeiro e que, de facto, ensinas o caminho de Deus. Não dás preferência a ninguém, pois não consideras um homem pelas aparências. Diz-nos, pois, que te parece: é lícito pagar imposto a César, ou não?’ Jesus, porém, percebendo a sua malícia, disse: ‘Hopócritas! Por que me pondes à prova? Mostrai-me a moeda do imposto’. Apresentaram-lhe um denário. Disse ele: ‘De quem é esta imagem e a inscrição?’ Responderam: ‘De César’. Então disse-lhes: ‘Devolvei, pois, o que é de César a César, e o que é Deus, a Deus’. Ao ouvirem isto, ficaram maravilhados e, deixando-o, foram-se embora.” (Mt 22, 15-22)

Este trecho vem imediatamente na sequência do texto da semana passada. Esta sentença insere-se num conjunto mais ou menos longo, entre os capítulos 19 e 23, essencialmente narrativos, que incluem várias parábolas e sentenças, compondo assim um conjunto de ensinamentos. Este, em particular, como o que abordei na passada semana, acontece já depois da entrada triunfal em Jerusalém, que o autor descreve no cap. 21, portanto, perto já dos acontecimentos centrais do Evangelho.
Descreve-se aqui mais uma tentativa de apanhar Jesus em falso. Uma das constantes por todo o Evangelho (não apenas em Mateus), é a tentativa por parte dos fariseus, de desmascarar ou apanhar Jesus em contradição. Aqui, assume uma certa dialética, quase um jogo, entre fariseus (que constantemente querem deitar por terra a popularidade e a firmeza dos ensinamentos de Jesus) e Jesus, que de todas as vezes os ultrapassa em sabedoria. Existe também aqui, por parte do autor, uma preocupação em mostrar a novidade de Jesus (Mateus escreve o evangelho para cristãos de origem judaica, logo para pessoas que entendem e vivem na mentalidade e cultura judaicas. Era importante que a figura de Jesus fosse apresentada não em contradição, mas como culminar, cumprimento e, ao mesmo tempo, novidade absoluta, das escrituras).
Jesus reage expondo de imediato as intenções dos interlocutores: “Hipócritas!”. Trata-se, de facto, de uma armadilha montada para denunciar Jesus às autoridades civis como estando contra o regime romano. Se a resposta tivesse sido outra, Jesus teria sido acusado de tumultuar as multidões e incentivar a desobediência civil. Por isso, também são convocados os herodianos, isto é, aqueles que são partidários de Herodes, o rei judeu. Seriam estes a denunciar junto dos romanos a prevaricação de Jesus.
Os fariseus, um dos “partidos” da sociedade judaica (havia vários… estes deram origem à corrente rabínica) procuravam proteger a sua influência junto do povo. Jesus aparecia como alguém que arrasta multidões, não impondo regras nem leis nem preceitos, mas passando uma mensagem nova.
A resposta é clara: pois se aceitam a autoridade romana, também é justo que contribuam para essa sociedade. Mais ainda: a autoridade civil não se sobrepõe à autoridade religiosa, nem vice-versa. Ambas cumprem um papel e estão colocadas em esferas diferentes. Simples, não?...
Dúvidas, como de costume, para o mail.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Citação da semana (mais ou menos):

Jesus voltou a falar-lhes em parábolas e disse: “O reino dos Céus é semelhante a um rei que celebrou as núpcias do seu filho. Enviou os seus servos para chamar os convidados para as núpcias, mas estes não quiseram vir. Tornou a enviar outros servos, recomendando: ‘Dizei aos convidados: eis que preparei o meu banquete, os meus touros e cevados já foram degolados e tudo está pronto. Vinde às núpcias’. Eles, porém, sem darem a menor atenção, foram-se, um para o seu campo, outro para o seu negócio, e os restantes, agarrando os servos, maltrataram-nos e mataram-nos. Diante disto, o rei ficou com muita raiva e, mandando as suas tropas, destruiu aqueles homicidas e incendiou-lhes a cidade. Em seguida, disse aos servos: ‘As núpcias estão prontas, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois, às encruzilhadas e convidai para as núpcias todos os que encontrardes’. E esses servos, saindo pelos caminhos, reuniram todos os que encontraram, maus e bons, de modo que a sala nupcial ficou cheia de convivas. Quando o rei entrou para examinar os convivas, viu ali um homem sem a veste nupcial e disse-lhe: ‘Amigo, como entraste aqui sem a veste nupcial?’ Ele, porém, ficou calado. Então disse o rei aos que serviam: ‘Amarrai-lhe os pés e as mãos e lançai-o fora, nas trevas exteriores. Ali haverá choro e ranger de dentes’. Com efeito, muitos são chamados, mas poucos escolhidos”. (Mt 22, 1-14)

Existem muitas passagens da Bíblia que se referem ao Reino dos Céus. Escolhi esta, que considero muito expressiva e simbólica, para começar esta espécie de rubrica, acrescentando no blog um espaço semanal (aproximadamente…) de reflexão sobre uma passagem. Começo, precisamente, pelo fulcro da mensagem bíblica: o Reino dos Céus.
O género parabólico é amplamente utilizado na Bíblia. Jesus fala aos discípulos quase sempre através de parábolas ou usando linguagem parabólica.
Isto permite-nos a busca de significados vários, adequando e interpretando a mensagem, na procura da forma de melhor fazer entender a mensagem contida. Não significa, porém, que seja lícito interpretar a bel-prazer o que é colocado na boca de Jesus. A interpretação das parábolas, como da Bíblia em geral, está sujeita ao contexto e à mensagem e intenção teológica do autor. Dito de outro modo: existe na linguagem parabólica, precisamente por recorrer ao uso de símbolos e metáforas, a possibilidade de buscar sentidos de interpretação, mas não existe a possibilidade de procurar sentidos para além da intenção com que as parábolas foram escritas. O mesmo vale para o texto bíblico no seu todo: a verdadeira baliza é, realmente, aquilo a que chamamos a intenção teológica do autor sagrado – a razão pela qual escreveu este texto e aquilo (mensagem) que pretende transmitir, para uma situação ou contexto concretos.

Esta é uma parábola muito forte. Utiliza termos duros, ao mesmo tempo que fala do banquete celeste: o Céu. Utiliza uma linguagem bastante alegórica, sendo possível antever duas cenas distintas: até ao versículo 10, trata-se da felicidade messiânica. Deus é o rei, o Messias é o filho. O banquete é a felicidade celestial. Os enviados são os profetas e os apóstolos. Os convidados são os judeus, o povo eleito, e por isso mesmo os convidados por excelência, mas que recusam o convite e maltratam os enviados. Os que são chamados nas encruzilhadas e caminhos são os pagãos (em sentido lato, aplicando ao quotidiano, somos cada um de nós).
A partir do v. 11 a cena muda: o banquete é o juízo final. Mateus funde na mesma parábola o banquete eterno e o juízo, onde os convidados devem vestir a veste nupcial. É talvez a cena mais intrigante: Porque expulsa o rei o mendigo, por causa da veste, se foi chamado do caminho?... Existe aqui um paralelo com Ap 19, 8. Aí relata-se a alegria do banquete eterno, na Jerusalém Celeste (= Reino dos Céus), em que os convidados estão vestidos de branco (= pureza). Este conviva não estava com a veste nupcial, o mesmo é dizer, não estava purificado, não era dos justos, não estava ali de coração. Tudo formas de dizer que para o banquete todos são chamados. Mas cada um é livre de aceitar ou não o convite. Uma vez aceite, está implícita uma mudança de vida. Para quem recusa o convite, há trevas exteriores (o mundo fora do banquete), choro e ranger de dentes (desespero; angústia; sofrimento). Importa dizer que as trevas exteriores, o choro e o ranger de dentes são alegorias simbólicas para significar a não aceitação do convite, ou seja, não se está a fazer aqui um rol do que espera aqueles que recusam Deus (como um castigo), mas antes o que existe, do ponto de vista do evangelista, fora da comunhão com Deus. Por outras palavras: na parábola, ninguém é condenado ao infortúnio. O conviva é lançado fora, como consequência da sua impertinência: o convite supunha a veste nupcial (= mudança de vida = “sequela Christi”). Ao não envergar o traje, recusou a pertença ao banquete. Por isso sai, atado de pés e mãos (ou seja, incapaz de se desfazer das coisas que o “atam”). Volta para onde veio (encruzilhada = dúvida; indecisão; angústia. O mundo sem Deus).
Simbologia bonita!
Como sempre, dúvidas e questões para o mail!